A conexão entre riscos estratégicos, gestão de portfólio e governança corporativa

Um descuido na governança e uma única decisão desalinhada pode comprometer a estratégia e o futuro da sua organização.

por Joel Solon Farias de Azevedo
Fundador da ProValore

A governança corporativa abarca muitos processos decisórios, dentre eles a gestão estratégica de riscos e a gestão estratégica dos portfolios de processos e projetos, que fica evidenciada nas grandes decisões das organizações, as quais envolvem mais risco e incerteza em relação ao futuro, como nos exemplos abaixo, separadas por famílias:

  1. Pessoas

Decisões de revisão nas estratégias de atração, desenvolvimento, retenção, remuneração, benefícios, captura e disseminação de conhecimento, qualidade de vida, etc. Uma boa referência neste sentido estão no livro do Claudio Fernández-Aráoz – Grandes Decisões Sobre Pessoas: Por que são tão importantes, por que são tão difíceis e como você pode dominá-las a fundo  

  1. Estrutura

Decisões de investimento ou inversões em imóveis próprios ou alugados, infraestrutura própria ou terceirizada, frota própria ou terceirizada, logística própria ou terceirizada, etc.;

  1. Tecnologia

Decisões de investimento ou inversões em hardware e software próprio ou terceirizado, licenciado ou livre, desenvolvimento de software próprio ou terceirizado, suporte técnico próprio ou terceirizado, etc.

Grandes decisões implicam invariavelmente em mais risco e mais incerteza e maior comprometimento do orçamento de investimento e consequente da capacidade de mudança da organização.
Consequentemente, são escolhas forçadas, de priorização em relação a opções concorrentes. A decisão que não seja a melhor decisão compromete e atrasa o futuro da organização, e o tempo não volta.

Os três principais pontos:

  1. A gestão de riscos estratégicos

Grandes decisões definem o futuro da organização, se e quando alinhadas à estratégia. Ao contrário, podem significar o fim da organização, se não alinhadas ou equivocadas ou retardadas. Exemplos: você lembra da Kodak? Nesta série de artigos nós já tratamos mais especificamente dos riscos estratégicos em https://www.provalore.com.br/gestao-estrategica-de-riscos-5-dicas-sucesso/

  1. A gestão de portfólio de processos e projetos

Processos são vivos e dinâmicos e é normal que tenham um ciclo de vida e que sejam melhorados ou substituídos. A não decisão de mudar ou a decisão de manter podem ser fatais. Exemplos: a Kodak com o seu o filme e papel fotográfico e o serviço público brasileiro ainda insistindo no processo físico, com papel e com assinaturas e certidões negativas impressas em papel.

Projetos também são vivos e dinâmicos com ciclo de vida cada vez mais curto e necessidade de fazer com que os processos da organização gerem mais valor com menos esforço. Exemplos: o processo eletrônico no serviço público é uma lei de 2006 e que quase 14 anos depois ainda não é realidade.

O risco estratégico real associado ao nosso exemplo do processo eletrônico? A inteligência artificial já é uma realidade capaz de reduzir incrivelmente o esforço e o trabalho humano com a eliminação de atividades que hoje utilizam mão-de-obra direta e não agregam valor algum ao resultado final do processo. Associe a isto a possibilidade de eliminação de falhas humanas e fraudes, sempre humanas.

O choque de realidade: quantas organizações públicas brasileiras virtualizaram 100% de seus processos e, portanto, podem aproveitar rapidamente tudo o que a inteligência artificial tem a oferecer?

  1. A governança corporativa

Aqui precisamos segregar as grandes empresas de capital aberto que por imposição legal tem conselhos de administração cujo presidente, normalmente, não é o executivo principal.

E a atribuição dos CA’s é justamente avaliar e decidir, sob sua alçada exclusiva e não delegável ao principal executivo, as grandes causas estratégicas ligadas ao negócio e aos seus componentes estruturantes: pessoas, estrutura e tecnologia. Não é à toa que este modelo colegiado foi desenvolvido e adotado no mundo todo. No Brasil, ele está regulado na Lei das S.A. – 6404/76.

Já a regra para as demais organizações é governança falha, incipiente ou inexistente.

O principal problema

Pois, vamos ao principal problema: a maioria das organizações públicas ou privadas não tem CA’s estruturados e atuantes. E em muitas que tem CA o cargo de presidente do conselho é acumulado pelo executivo-chefe.

A consequência é a multiplicação geométrica de todos os riscos associados às decisões monocráticas que tanto conhecemos: visão estreita, visão comprometida, visão influenciada de boa ou má-fé, e no limite, até incompetência gerencial mesmo.    

Um caso hipotético de decisão monocrática de alto risco

Vejamos este caso: o responsável pela área de TI de uma organização de porte médio e alcance estadual é influenciado por um grande fornecedor de soluções de tecnologia de alcance mundial a adotar uma nova tecnologia, mas não tão nova assim. Uma solução de hardware e software caríssima e proprietária com storage/equipamento próprio no ambiente da organização.

Vejamos agora as implicações:

  1. o responsável da área de TI tem interesse direto na contratação da solução;
  2. o responsável da área de TI sabe que o seu executivo-chefe não confia em soluções em nuvem ou ter os dados do negócio da organização em algum lugar qualquer no mundo que ele não sabe qual é;

Pois simulemos este processo decisório defectivo:

  1. o responsável da área de TI recebe visita do fornecedor e conhece a solução e todas as suas vantagens, e gosta;
  2. ele recebe do fornecedor inclusive os argumentos de venda da solução para convencer o seu executivo-chefe, valorizando pontos positivos e suprimindo pontos negativos;
  3. ele marca audiências em separado com o executivo-chefe para demonstrar a solução;
  4. se o executivo-chefe costuma convidar assessores, estas pessoas são visitadas e convencidas previamente;
  5. o executivo-chefe fica convencido das vantagens da solução e toma a decisão de compra monocraticamente, exercendo o seu poder de fato.

Agora imagine que nesta mesma organização talvez existam comitês de gestão de riscos estratégicos e de gestão corporativa que avaliariam as vantagens e desvantagens estratégicas e mesmo o alinhamento estratégico de cada proposição de forma comparada com outras tantas possibilidades, visando otimizar o aproveitamento de oportunidades de forma  concomitante à redução e controle de riscos e ameaças reais.
Pois, no nosso exemplo isto não valeu de nada e a decisão tomada muito provavelmente não será revertida.

A solução   

Nós trabalhamos com consultoria de gestão há muito tempo e podemos afirmar que a solução não é simples e ela passa por várias estratégias, todas elas desagradáveis, porque implicam no compartilhamento do poder e na valorização da decisão colegiada em detrimento da decisão monocrática:

  1. definição clara de alçada exclusiva ao CA das grandes decisões estratégicas, em função de continuidade, ruptura, ampliação ou redução do negócio e idem em relação aos componentes estruturais da organização como pessoas, estrutura, tecnologia e conhecimento;
  2. definição e atuação efetiva e obrigatória com reunião ordinária periódica de comitês de governança corporativa com participação representativa de toda a organização e não apenas da administração;
  3. definição de processo decisório com trâmite obrigatório das grandes decisões pelos comitês de governança corporativa para avaliação e parecer em relação à gestão estratégica de riscos e avaliação do impacto estratégico nos portfólios de processos e projetos e nos resultados da organização, no presente o no futuro.

Artigos anteriores da série

Este é o décimo primeiro artigo de uma série destinada a entender a necessidade urgente de investir na evolução da governança e gestão nas organizações e assim aumentar a sua eficácia e geração de valor.

No primeiro artigo da série – Governança pública – dicas de sucesso – falamos da necessidade de se ter um calendário anual de governança que privilegie o pensamento estratégico integrado em detrimento da lógica orçamentária inercial e continuísta, tão precária.

No segundo artigo da série – Governança pública – saiba a diferença entre governança e gestão – apontamos item a item as diferentes responsabilidades: da governança com o direcionamento estratégico e monitoramento dos resultados, e da gestão com a execução da estratégia definida e negociada.

No terceiro artigo da série – Dez práticas de sucesso na governança da gestão de pessoas – apontamos os diferenciadores da gestão do conhecimento da organização, que está nas pessoas que a compõem, e a necessidade de alinhamento do desenvolvimento do conhecimento com a estratégia e os objetivos da organização.

No quarto artigo da série – A governança e a gestão ativa dos riscos como oportunidades – tratamos do gerenciamento de risco como a permanente análise de cenários visando aproveitar ao máximo as oportunidades trazidas pelo ambiente externo.

No quinto artigo da série – Planejamento da força de trabalho – tratamos do planejamento e otimização da força de trabalho, o mais crítico de todos os recursos: a alocação ótima das pessoas e da sua inteligência e conhecimento às atividades desempenhadas pelas organizações.

No sexto artigo da série – A política de gestão de riscos do Tribunal de Contas da União – tratamos da adoção pelo TCU de uma política de gestão de riscos simples e efetiva e alinhada com as melhores práticas de auditoria mundiais, fazendo referência explicita ao tratamento das incertezas e aproveitamento das oportunidades.

No sétimo artigo da série – TCU – Resultados do Levantamento Integrado de Governança Organizacional Pública – ciclo 2017 – tratamos da avaliação do método e dos resultados do primeiro levantamento integrado de todas as governanças, realizado pelo TCU.

No oitavo artigo da série – TCU – Referencial básico de gestão de riscos – tratamos da adoção pelo Tribunal de Contas da União de um Referencial Básico de Gestão de Riscos – que privilegia a gestão dos riscos estratégicos e sobre os resultados sobre os riscos operacionais.

No novo artigo da série – Gestão estratégica de riscos: 5 dicas de sucesso – tratamos da importância da gestão estratégica dos riscos, principalmente da gestão dos riscos sobre os resultados.

No décimo artigo da série – Os desafios da governança pública –  tratamos  das barreiras e desafios à ativação da governança e do controle externo e social na organização brasileira.

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