Esquentar a cadeira não é produtivo

Apesar das políticas empresariais de conciliação de horários, trabalhadores espanhóis cumprem expedientes prolongados por causa da pressão dos chefes e da cultura do presenteísmo.

por Ana Torrez Mernarguez, no El País

Nos países nórdicos, as luzes dos escritórios se apagam às 17h. Para que algum funcionário permaneça na sua cadeira depois disso é preciso haver um motivo de força maior. O horário de expediente é programado para garantir uma produtividade intensiva, com a contrapartida de oferecer um equilíbrio entre a vida pessoal e a profissional. Na Espanha já começam a ser adotados os horários flexíveis, que dão uma margem de várias horas tanto na entrada como na saída, e também existem profissionais que cumprem jornada parcial ou trabalham remotamente, das suas casas. Mas, diferentemente do que acontece em países como a Noruega, o presenteísmo continua sendo valorizado. Pega bem passar horas a fio diante do computador.

“Muitas empresas do IBEX 35 [índice da Bolsa espanhola] têm políticas de conciliação [de horários], mas nem sempre as cumprem”, diz Esther Jiménez, pesquisadora do Centro Internacional Trabalho e Família da escola de gestão IESE. Depois de ter realizado um estudo envolvendo mais de 30.000 pessoas em 23 países da África, Ásia, Europa e América Latina, uma das conclusões é que numa mesma empresa alguns departamentos estimulam a conciliação de horários, e outros, não – depende dos chefes, e não do protocolo aprovado. “Criam-se ambientes tóxicos, em que os trabalhadores sofrem maiores níveis de estresse, têm maior intenção de deixar a empresa e reduzem sua produtividade. Tudo como resposta às exigências dos superiores”, observa Jiménez. Por outro lado, segundo essa pesquisa, o rendimento cresce 19% em ambientes trabalhistas que promovem a flexibilidade.

Um dos desafios na Espanha é fazer as companhias implantarem “horários racionais”, que implicam flexibilidade na chegada e na saída, um máximo de 45 minutos para o almoço e uma jornada que não vá além das 17h, segundo Ignacio Buqueras, presidente da Comissão Nacional para a Racionalização dos Horários Espanhóis. Essas medidas elevam a produtividade em 11% a 15%, além de reduzirem enormemente os gastos das empresas (entre eles o energético), segundo as estimativas desse órgão. “O presenteísmo está muito enraizado na nossa concepção do trabalho. É um grande erro e deveria ser substituído por práticas que promovam a eficiência”, destaca.

Mas, boas intenções empresariais à parte, existe uma cultura trabalhista, e o hábito de ir embora depois do chefe é difícil de abandonar. Um exemplo disso é o que aconteceu em 2005 no escritório de arquitetura norueguês Snohetta. A abertura de uma filial em Nova York e a tentativa de implantar o seu modelo nórdico se chocou com o modus operandi dos norte-americanos. O horário das 9h às 17h não casava com seu estilo de vida – os funcionários costumavam entrar mais tarde, faziam longos intervalos de almoço e só iam embora depois das 20h, sempre depois do chefe. Os gerentes insistiam para que os subordinados respeitassem o horário norueguês, mas não havia jeito, relata a pesquisadora Elin Kvande, que estudou o caso dessa empresa e o apresentou na Conferência Nórdica da Vida Profissional, organizada em 2012 pelo centro nacional dinamarquês de pesquisas sociais.

O equilíbrio entre o trabalho e a vida familiar é básico para essa companhia da Noruega, e por isso seus funcionários gozam de cinco semanas de férias por ano – algo que irritou os funcionários do outro lado do Atlântico, até que um pacto acalmou os ânimos: os norte-americanos só descansariam três semanas, e por esse motivo ganhariam mais do que os colegas na sede escandinava.

Na Espanha, empresas como a Iberdrola deram um passo à frente quanto à racionalização dos horários. Em 2008, a empresa selou um acordo com seus 9.000 trabalhadores para universalizar a jornada intensiva, estabelecendo um expediente das 7h15 às 14h50, com 45 minutos de flexibilidade na hora de entrar ou sair. Segundo dados da própria empresa, a produtividade melhorou, com um ganho superior a 500.000 horas trabalhadas a mais em um ano. Além disso, o absenteísmo diminuiu em 20%, e os acidentes de trabalho tiveram redução de 16%.

Outras companhias menores, como a consultoria de redução de riscos trabalhistas Grupo17 (1.000 funcionários), também se mexeram. Há quatro anos, a direção estabeleceu que alguns funcionários trabalhariam remotamente, e que os demais disporiam de apenas uma hora de almoço e 45 minutos de flexibilidade tanto na à entrada como na saída. Às 18h, todos já foram embora. A produtividade aumentou 30%. “Os funcionários sabem que podem contar com a empresa. Nós os escutamos e, se tiverem motivos para chegar duas horas mais tarde, não lhes pedimos justificativas”, conta María Jiménez, gerente do grupo.

Em empresas como a consultoria tecnológica Neoris, com mais de 3.500 funcionários espalhados pelo mundo (750 na Espanha), os horários não são fixos; já faz tempo que os trabalhadores são avaliados pelo cumprimento de metas. “Há muitas empresas onde que ninguém controla o ponto. Importam os resultados e se incentiva a autogestão”, afirma Pedro Irujo, vice-presidente da empresa para a Europa, Oriente Médio e África. Agora, os executivos estão voltados para o “bem-estar” da sua equipe, aplicando pesquisas para mensurar fatores como o grau de satisfação com as chefias, a luminosidade dos ambientes de trabalho, o ruído e o salário. A intenção é que os empregados sintam que a empresa se preocupa com eles. “Já disse Napoleão: um soldado motivado vale por três”, acrescenta Irujo.

Além disso, foram contratados diversos serviços para facilitar a vida dos funcionários, como a instalação de uma lavanderia na própria sede e os conhecidos vales para serem usados em restaurantes e creches – uma forma de pagamento em espécie que permite aos funcionários recolherem menos imposto de renda. “Programamos atividades fora do escritório, como corridas para estimular o team building (trabalho em equipe). No ambiente trabalhista há mais restrições. Ao sair, fala-se de outros temas, cria-se companheirismo e se confia.” Não há retorno econômico. “É um investimento na felicidade dos trabalhadores”, desconversa.

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